Melodia do tempo 

Gosto de ouvir
o som da chuva a cair
em harmonia de tons
leve, calma e relaxante
 de um piano que martela
violinos envolvem gemendo
bruscamente mudando a nota
por variação da ventania
as gotas da chuva engrossando
aumentam de intensidade
ribomba um trovão
bombo marcando o tom
de eufórica melodia
escrevendo novas notas
em rápidos e aguerridos tons
a ventania amaina
a melodia de novo relaxante
as gotas da espessa chuva

continuam em toada lenta, constante

gosto de ver a chuva deslizar pela janela 
sonhando lágrimas de saudade
sentidas por alguém ausente
e sinto-me embalado
pela sinfonia que a chuva me traz

.

Autor : Pintor de Palavras

Imagem : Alissa Monks

 A criança que o não foi

do acaso gerado
por acidente parido
desde cedo levado
madrugadas adentro, ainda o sol dormindo
para as lavras campesinas
em retalhos de mantas envolvido
para dos frios, chuvas e ventos protegido
assim á escola chegado
João de Deus e sua cartilha
“E uma régua malfadada”
mestres no ensino
brincar não era opção
o trabalho chamava, para poder ganhar o pão
foi de juventude fugidia
pois sobreviver era o que urgia
para guerra que sua não era
foi mandado combater
sem poder opinar
obrigado a obedecer
arrastado em revolução
outro poder viu nascer
levado no turbilhão
sempre lutando para sobreviver
à efervescência dos movimentos
ultrapassando o cabo das tormentas
em promontório embarcado
de tudo e nada rodeado
vai vagando sua mente
revendo tempestuoso mar navegado
de que resta somente
envolto na névoa do passado
fosco vulto da vida de uma criança
 
que não foi criança!

.

Autor :Pintor de Palavras

Imagem : Colin Roberts

Ouso

  Ouso ouvir

O sussurrar do vento
Em liberdade esvoaçando
Seus dóceis murmúrios
Com a floresta dialogando
Graciosamente
As folhas das árvores afagando
Escrevendo a pauta
De suave melodia
Por violino de vento tocada
Balançando das árvores as ramadas
No salão da floresta
Vai dançando
Baile de máscaras
Onde se vão contando
De um mundo inconstante
Segredos que só ele conhece
E que suavemente
Às árvores vai narrando

.

Autor : Pintor de Palavras

Imagem-Desconheço o autor
 

 Poeta 

 

 
Não me sinto poeta
Nem a tal aspiro ser
Com pincel de pensamentos
Estampando a lisa tela
Seara de ideias semeando
Exprimindo em cada palavra
As cores das ideias nascidas
Qual aranha de pensamentos
Vai tecendo a sua teia
Nas Histórias que são a vida
Ilustrando na tela
As marcas que o tempo lhe fez
Cinzentas e frias algumas
Das dores que a vida lhe deu
Alegres quentes, garridas
Fruto de alegrias que a vida lhe concedeu
Os traços que vai deixando
Na tela por onde desliza
A tela acaricia
Em suas cores recitando
A poesia de um fado
E se aqui nasceu um poema
Por um pincel falado
Não foi porque um poeta o criou
Foi por um pincel
Em tela declamado.

Autor : Pintor de Palavras

Imagem :gareth pon

Diz-me

 

Fim de tarde
Anos passados memórias presentes
Insinuações indiciantes
Imperativas razões coartam continuidade
De sensual diálogo
Nas vontades comuns
Germina a semente
De intimidades profundas
Na troca de sexual apetite
Em loucura de afetos
Corpos se misturam
Detonando sensuais desejos
Grilhetas se quebram
Mistura de fluidos
Pelos corpos libertados em êxtase de loucura
Na total entrega de amor sedentos
Do sabor de quentes e húmidos beijos
No amor que fizemos
Amantes secretos que fomos
Jamais esqueceremos
 .
Diz-me!
Onde foi que nos perdemos?

.

Autor : Pintor de Palavras

Imagem : Maria Magdalena Oosthuizen

 

Caminho

Passei por aqui

Caminhando não sei para onde

Não sei porquê, nem para quê

Calcorreio este caminho

Desconhecendo o que procuro

Talvez te procure a ti.

Ou a mim.

Pois talvez

Este caminho que surge do nada

Dobro uma esquina

Será que estarás lá?

Quem sabe o que as esquinas escondem

Ou serei eu quem lá estará?

Esperando por ti

Ou por mim

Ou somente esperando

Por novo caminho

Que esmiuçarei até…

.

Autor : Pintor de Palavras

Imagem .Michelle Ellis

 Bivalves

Da beleza das suas águas

Nos segredos que encerra

Desde imemoriais tempos

De Naus sepulcrário

Do Mar da Palha até ao Mouchão

Fisgadores de bivalves

Às centenas, talvez milhares

Impossíveis de contar

Em lamacentas águas

Esquadrinham cada centímetro

Buscando suas presas

Traiçoeiros baixios espreitam

Em suas manhosas correntes de Baixa-Mar

Em cada maré cheia

Algumas vidas roubadas

Na procura de parco sustento

São as vidas arriscadas

Em traiçoeiras correntes

É a vida de quem luta

Pelo sustento dos seus

É a vida destas gentes

                        .

Autor :Pintor de Palavras

Imagem : Autor Desconhecido

 

 Dedicado a quantos perderam a vida na apanha da ameijoa no Mar da Palha